APEP, TIAMAT E LEVIATÃ: O
INTERCÂMBIO RELIGIOSO NA ANTIGUIDADE PRÓXIMO ORIENTAL
Priscila Scoville
Grosseiramente,
definimos História como a ciência que estuda o passado, contudo, o modo como
devemos realizar esse estudo é alvo de constante debate dentro da Academia.
Resulta disso uma vasta gama de teorias e abordagem que buscam definir a
disciplina. De certo modo podemos afirmar que as diferentes formas de se
entender a História nos ajudam a encontrar um passado mais abrangente, com
pesquisas direcionadas tanto ao macro como ao micro e em áreas opostas: a um
grupo de pessoas e a um indivíduo, a uma cidade e a um sistema de pensamento, a
nobreza e ao comum, a ritos e ao cotidiano, etc. São muitos os focos que podem
ser dados, mas ainda assim a História possui limites e por isso o historiador
deve estar constantemente atento. Essas limitações, em muito, refletem uma
realidade menos documental e mais inerente a disciplina. Ora, o historiador é
fruto de seu tempo e trabalhará suas fontes por meio da formação que lhe foi
dada – ele não tem os mesmos olhos que o escriba que escreveu um documento no
passado, está distanciado no tempo e, provavelmente, no espaço. Trabalhei mais
profundamente essas questões na edição passada deste simpósio, com um texto que
hoje está disponível no ebook “Diversos Orientes” (BUENO, et all, 2018, pp. 83-90).
Destarte, acredito ser importante reforçar a questão da subjetividade
humana e do impacto que o uso político da História tem no nosso entender sobre
o passado. A apropriação da História para fomentar a criação de identidades
nacionais resulta em um foco bastante eurocêntrico, que não contempla diversos
povos, em especial, do oriente. Nesse sentido, a História é uma ferramenta
política e um agente da memória social que busca estabelecer uma identidade
coletiva, que está enraizada e define o “nós”, em detrimento do “outro”. (GUARINELLO,
2014).
Nessa História
ocidentalizada, a antiguidade é apenas Grécia e Roma, os outros povos não fazem
parte da História Antiga por serem alheios a cultura ocidental. Queremos ser
ocidentais e provar uma superioridade cultural, por isso ignoramos que a
realidade oriental já era politicamente organizada e com centros de estudo para
compreender o mundo e a natureza desde muitos anos antes do período clássico.
Por causa desse caráter identitário, pesquisas que fogem a esse padrão
ocidental acabam por serem consideradas alheias à História. Não à toa, os
estudos da antiguidade oriental não pertencem ao Departamento de História na
maioria das universidades do mundo – e nesse sentido o Brasil é uma exceção. Na
Europa e nos Estados Unidos encontramos esse tipo de pesquisa nas áreas de
Arqueologia, Linguística ou em disciplinas próprias como Assiriologia,
Egiptologia ou Estudos Próximo-Orientais, mas não na História. A História,
tradicionalmente, elimina os vestígios que não condizem com seu propósito e por
isso a Antiguidade é somente a clássica.
Tal
construção narrativa sobre o passado tende a isolar os povos: não se fala nos
contatos e interações do ocidente com o oriente (caso não seja uma relação de
dominação) e os povos orientais não recebem a atenção devida, sendo colocados
dentro de um mesmo modelo. Contudo, houveram diferentes grupos étnicos
coexistindo na Mesopotâmia e interagindo com outros grupos, não só nessa
região, mas também pela Anatólia, África e sul europeu. A negligência aos
estudos da antiguidade próximo-oriental provoca uma confusão no nosso
entendimento sobre os grupos ali habitavam. É frequente, por exemplo, encontrar
pessoas se referindo aos mesopotâmicos como uma sociedade, quando, na verdade,
Mesopotâmia compreende uma região e não um povo. Além disso, trabalhamos esses
grupos de forma generalizada, atribuindo a todos as mesmas características, e,
ao mesmo tempo, os isolamos, como se as sociedades existissem em forma
sequencial.
Por
esse motivo, proponho, neste breve ensaio, apresentar interações e influências
em grupos bem característicos que ocuparam o Antigo Oriente Próximo e que,
normalmente, não são pensados de forma aproximada. Viso, com isso, refletir a
antiguidade de modo integrado e mais humano, entendendo que os antigos
assimilavam e interagiam constantemente com diferentes ideias. Em um primeiro
momento, trarei elementos de forma geral para entendermos os contatos e, por
fim, proponho aproximações das religiosidades egípcia, babilônica e
judaico-cristão.
Intercâmbios
culturais são possíveis graças aos contatos, independentemente da forma que
assumem (uma explicação mais detalhada sobre as diferentes formas de contato pode
ser vista em Scoville, 2017, pp. 24-29). O contato é o responsável por propagar
diferentes visões de mundo que podem ser absorvidas e adaptadas. No presente
estudo, foco-me nas relações religiosas desse sincretismo, ou seja, procuro
elementos que envolvem crenças, práticas, cultos e ritos.
Um
primeiro elemento em comum no Oriente Próximo é que a religiosidade é composta
por crenças politeístas nesta região. Alguns estudiosos, inclusive, defendem
que até mesmo os cananeus/hebreus eram originalmente politeístas, elegendo YHWH
(Jeová) como deus único somente por volta do séc. XVIII AEC. Além disso, as
práticas religiosas são documentadas como performáticas, por meio de músicas,
poemas, hinos e atos simbólicos; a medicina aliava preces aos remédios, para que
a doença saísse do corpo. Egípcios e babilônicos ainda tinham mais semelhanças,
como o costume de deificação de reis ou as cerimônias de inauguração de
estátuas que permitiriam que a estátua ganhasse “vida”. Não sabemos dizer as
origens desse tipo de relação com a religiosidade, mas podemos perceber que
esses elementos estavam disseminados.
Algumas
outras práticas, por outro lado, são perceptíveis em sua origem, como, por
exemplo, a relação egípcia com o mundo dos mortos. É possível que os povos que
adotaram as práticas egípcias associadas a morte não conhecessem a crença por
traz delas, mas ainda assim a reproduziam. A título de ilustração podemos ver a
oferenda e alimentação dos mortos (imagem 1): encontramos imagens de mesas de
oferendas a frente de homens e mulheres em tumbas na Grécia e na região do
Levante, contudo, alimentar os mortos não era uma prática dessas regiões. Isso
significa que a imagem de uma crença egípcia foi levada para o Levante e
modificada de acordo com as crenças locais. Ademais, a crença egípcia da
entrada no mundo dos mortos possui a preservação do corpo como elemento
necessário, por isso o corpo recebia várias “camadas de proteção” com um ou
mais ataúdes dentro do sarcófago. Algumas regiões do sul da Europa se apropriam
da ideia do ataúde e passam a o usar.
Imagem
1: tumba de uma rainha síria.
ERMAN,
1907, p. 194.
Mais do que práticas, divindades também foram
absorvidas em diferentes panteões. Listo aqui algumas das mais conhecidas:
Astarte (deusa associada à guerra, sendo a contraparte da semita Ishtar. No
panteão egípcio, ao qual foi agregada na XVIII dinastia, sua primeira
associação está ligada com os cavalos e bigas. Diz-se que é filha de Rá e
esposa de Seth, mas também se relaciona como deus do mar, Yamm); Baal (vindo da
região de Ugarit, foi aceito na religião egípcia na XVIII dinastia ligado à
tempestades e trovões); Baalat (contraparte feminina de Baal. É associada a
deusa Hathor, pelo menos desde o Reino Médio, por meio do Templo de Serabit
el-Khadim, no Sinai); Yamm (deus do mar, aparece como inimigo que deseja
destronar Baal, iniciando uma batalha que, em algumas versões do mito, levaram
Yamm a exclusão do mundo dos deuses, sendo obrigado a ficar com os homens –
assim como a queda de Lúcifer. Segundo alguns pesquisadores, Yamm é idêntico ao
deus Lotan, representado como uma serpente) (HAT, 2005).
Não tenho o intuito de apenas ficar elencando
semelhanças pontuais, por isso trago três exemplos de religiosidade para
pensarmos essas relações. Começo, então, com o livro do Amduat, um texto egípcio que nos apresenta a crença do renascer do
sol. Essa crença conta sobre a passagem do sol (deus Rá) nas 12 horas noturnas
dentro do corpo de Nut (deusa do céu). Cada hora representa uma eternidade no
mundo dos deuses, em que Rá deveria vencer desafios até poder nascer novamente.
Deste modo, a cada nascer do Sol o mundo todo era recriado. Foco no
acontecimento característico da sétima hora noturna, quando Rá encontra Apep, a
serpente que sugou toda a fertilidade da terra.
A principal representação de Apep é como fonte
de todo o mal do mundo, físico ou moral. Ela está associada à escuridão,
tempestades e a noite. Segundo a crença, Apep era a escuridão que envolvia o
abismo do mar primordial, Nun, criando muita dificuldade para o sol quando ele
tentava sair da terra, para levantar-se pela primeira vez e, consequentemente,
possibilitar a vida no mundo. Para os egípcios, todas as noites Apep esperava
Rá em uma tentativa de prendê-lo na escuridão, impossibilitando o renascer do
sol e a manutenção da existência na Terra.
Após
uma batalha, Rá finalmente vence Apep, seu maior desafio na escuridão, porém
ainda tem outros afazeres antes de renascer. Rá
passa pela necrópole dos mortos renascidos no dwat (mundo dos mortos), onde eles despertam e no final da oitava
hora voltam a repousar. Em seguida, temos uma hora de descanso de Rá, em um
local oculto e longe dos inimigos. Na décima hora, Rá volta a encontrar os
mortos, mas dessa vez aqueles que foram vítimas de afogamento no Nilo, que não
puderam passar pelo tribunal de Osíris, pela falta de corpos mumificados. Na
hora seguinte, os mortos que tiveram seu coração comido por Ammit são
condenados e jogados ao fogo, e por fim, Rá se prepara para renascer. É somente
na décima segunda hora noturna que Rá anuncia o renascimento, rejuvenesce e
nasce na forma de Kheper, o sol da manhã (SCHWEIZER, 2010, pp. 119-194).
A
associação da serpente com o mal também é visível na religiosidade babilônica,
na qual a deusa Tiamat é representada como uma serpente e é tida como
encarnação de todo o mal, físico e moral. É possível que, originalmente, Tiamat
fosse a deusa das nuvens de chuva e nevoeiros da região entre o os rios Tigre e
o Eufrates que durante algumas épocas do ano, visto do deserto, pareciam uma
grande serpente. Além
disso, Tiamat é, também, a deusa das águas salgadas (mar), cuja união com as
águas doces (deus Apsu), deu origem ao universo – história expressa no épico de criação, o Enuma-Elish. Assim
como para os egípcios, os babilônicos acreditavam que as primeiras coisas
surgiram a partir das águas primordiais, que nesse caso eram Apsu e Tiamat.
De
forma resumida, o Enuma-Elish, ao descrever a criação do universo, nos conta a
História da revolta de Tiamat contra outros deuses e é por isso que ela
torna-se o mal: “Tiamat
tornou pesado o seu trabalho manual, ela perpetrou o mal contra os deuses seus
filhos. Para vingar Apsu, Tiamat planeou o mal” (Trecho do tablete II apud KING, s/d, p. 7). O desenrolar dessa guerra entre os deuses é
extensa, no centro da intriga temos, Marduk o único que seria capaz de derrotar
Tiamat. Quando a deusa é vencida, Marduk usa seu corpo para criar o céu e a
terra: “ele a separou como um peixe sem escamas em duas metades; metade dela a
estabeleceu com uma coberta para o céu. Fixou uma plataforma, postou uma
sentinela” (Trecho do tablete IV. KING, s/d, p. 23). Isso porque diz-se que ela
era enorme: Tiamat teria 50 kasbu de
comprimento (considera-se que cada kasbu
era uma jornada de duas horas caminhando, isso significa que levariam cerca de
4 dias para percorrer o corpo inteiro) e seu sangue teria escorrido de seu
corpo durante 3 anos, 3 meses e 1 dia, após a derrota.
Por
fim, a última serpente maligna que eu gostaria de evocar, antes de propor uma
reflexão entre esses povos, é o Leviatã. Em Isaías esse monstro marinho do
Antigo Testamento (associado ao diabo no Novo Testamento) é “a serpente tortuosa
[...] que está no mar” (Isaías, 27.1 apud
BIBLIA ONLINE). Ainda, é descrito por Jó com dentes temíveis, costas com
escudos firmemente unidos, sopros com lampejos de luz, olhos como os raios da
alvorada, com tições saindo de sua boa e fumaça saindo de suas narinas, com
pescoço forte e peito duro como pedra, pois “é rei sobre todos os filhos da soberba” (Jó, 41.15-34 apud BIBLIA ONLINE). Leviatã teria
surgido no quinto dia da criação e foi caçado por Gabriel, que junto com Javé,
teria o dominado.
Leviatã como uma
serpente e do mal ainda tem um outro elemento em comum com as crenças
anteriormente mencionadas: tá associado ao mar. Em Amós (9.4 apud BIBLIA ONLINE), diz-se: “e, se se
esconderem no cume do Carmelo, buscá-los-ei, e dali os tirarei; e, se dos meus
olhos se ocultarem no fundo do mar, ali darei ordem à serpente, e ela os
picará”. E, em Salmos existem duas passagens com essa aproximação: “eis o mar,
imenso e vasto. Nele vivem inúmeras criaturas, seres vivos, pequenos e grandes.
Nele passam os navios, e também o Leviatã, que formaste para com ele brincar.
(SALMOS, 104.25-26 apud BIBLIA
ONLINE), e “Tu dividiste o mar pelo teu poder; quebraste as cabeças das
serpentes das águas. Esmagaste as cabeças do Leviatã e o deste por comida às
criaturas do deserto” (SALMOS, 74.13-14
apud BIBLIA ONLINE).
Assim, Leviatã é
descrito como uma serpente que habita o mar. Uma das representações de Tiamat é
na forma de serpente com duas patas dianteiras. Apep é a serpente que suga toda
a fertilidade da terra. Uma questão interessante é que em uma das passagens,
Leviatã é descrito com muitas cabeças e, apesar de Tiamat não ser representada
com várias cabeças, o deus cananeu Lotan é. Lotan é dito como uma das formas
posteriores de Tiamat, é um monstro que possui sete cabeças e também é o mar, a
partir da ligação com Yamm (mencionado anteriormente). A questão que fica,
então é, por que essas três cosmogonias têm serpentes associadas ao mal?
Acredita-se que durante o período pré-dinástico, o Egito era enfestado com
várias espécies de serpentes. O receio destes animais permaneceu no imaginário
egípcio, por meio de mitos e lendas, mesmo quando quase já não existiam cobras
na região. Apesar de nunca ter havido muitas serpentes no Levante, a região sul
da Babilônia, de onde vieram Abraão e seus companheiros, possivelmente também
era enfestada. Assim o temor da serpente foi levado para os hebreus e semitas.
Podemos, ainda, traçar
outros paralelos. Em primeiro lugar, temos a existência do herói que domina a
serpente: Tiamat só pode ser dominada por Marduk; Apep por Rá; e Leviatã por
Gabriel, ainda que todos pudessem contar com auxílio. E continuo, fez-se uso do
corpo da serpente: com a pele de Leviatã, Gabriel fez uma tenda na qual os
justos pudessem habitar e cobriu a cidade de Jerusalém; já o corpo de Tiamat
foi usado por Marduk para cobrir o mundo, criando o céu e a terra.
Além
disso, o julgamento dos mortos também é comum aos egípcios e à crença
judaico-cristã. No Egito isso é percebido por meio do Tribunal de Osíris,
quando o morto responde sobre suas atitudes em vida, enquanto seu coração é
pesado com a pena de Maat (deusa da ordem, justiça e verdade), averiguando a
verdade de sua fala: “eu não causei dor. Eu não causei lágrimas. Eu não matei.
Eu não pedi para que matassem. Eu não fiz ninguém sofrer [...]” (Trecho do
capítulo 125 do livro dos mortos apud
LICHTHEIM, 2006, pp. 124-126.Tradução da autora). Na Bíblia, por sua vez,
existe a ideia de Juízo Final, o momento em que Deus julgaria as pessoas de
acordo com seus atos em vida: “Vi também os mortos, grandes e pequenos, em pé
diante do trono, e livros foram abertos. Outro livro foi aberto, o livro da
vida. Os mortos foram julgados de acordo com o que tinham feito, segundo o que
estava registrado nos livros.” (Apocalipse 20.12 apud BIBLIA ONLINE). Por fim, a existência de um “inferno” para
onde são destinadas as pessoas ruins é o último elemento que eu gostaria de
destacar. Escrituras judias, cristãs e islamitas estabelecem o local de para
onde os maus iriam: no exterior ao sudoeste de Jerusalém, em Gehenna. Para os
egípcios, gregos e outros povos politeístas, o mundo dos mortos é apenas um,
não há separação entre céu e inferno, mas existe uma distinção de onde os maus
ficariam. Para os egípcios, segundo o livro do Amduat, na eternidade da hora 8
os bons viveriam; os maus, por sua vez, estavam presos no fogo que queima
milhões que era a eternidade da hora 11.
Muitas
são as semelhanças entre diferentes cosmogonias, mesmo que seus princípios
sejam diversos. No caso apresentado, podemos encontrar semelhanças desde o mito
de origem até o mundo dos mortos. A criação do mundo parece ligada ao mar, com
Nun e Tiamat (ou Yamm/Lotan). No caso hebreu, porém, o mar está presente em
outros momentos, como o dilúvio (também referenciado no Épico de Gilglamesh) ou
com a abertura do mar vermelho. Há no mar uma representação importante, se
pensamos em meios práticos, os mares (vermelho e mediterrâneo) foram pontos
importante também para a organização destes povos, talvez por isso, incluir o
mar como entidade divina (e criadora) fizesse sentido nestas religiões.
A
existência do caos antes de qualquer coisa no mundo é visível em ainda mais
exemplos, como no grego e no nórdico, tendo Zeus e Thor o papel de expulsar o
caos e os titãs/gigantes. A serpente, como dito anteriormente, está ligada ao
temor de muito tempo, transformando-a, em muitos casos, em animais repulsivos e
encarnações do mal em maior ou menor escala. Podemos também encontrar heróis
responsáveis por dominar este mal, como Marduk, Rá e Gabriel. Os modos de
construção do mito parecem ser bastante parecidos, talvez o antigo testamento
tenha bebido de fontes semitas para a sua narração e de fontes egípcia para a
descrição do inferno, por exemplo.
Referências
Priscila
Scoville é Doutoranda em História pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, orientada pela Profª Drª Katia Maria Paim Pozzer. Bolsista CAPES; Representante
do ASE – Association for Students of Egyptology; Membro do LEAO – Laboratório
de Estudos da Antiguidade Oriental.
BÍBLIA
ONLINE. Disponível em:
https://www.bibliaonline.com.br/acf
(acesso 03 de julho de 2019)
BUENO,
André; CREMA, Everton; ESTACHESKI, Dulceli; NETO, José Maria [orgs]. Diversos
Orientes. União da Vitória/Rio de Janeiro: Edição especial Sobre Ontens-
LAPHIS/UNESPAR, 2018.
ERMAN, Adolf. A Handbook of Egyptian religion. Londres:
Archibald Constable & CO. Ltd. 1907.
GUARINELLO, Norberto Luiz. História Antiga. São
Paulo: Editora Contexto, 2014.
HAT,
George. The Routledge Dictionary of
Egyptian Gods and Goddesses. Nova York: Routledge, 2005.
KING, L. W. Enuma Elish.
O épico da
criação. Online. Disponível em:
https://docplayer.com.br/37012145-Enuma-elish-o-epico-da-criacao-l-w-king-tradutor.html
(acesso 03 de julho de 2019)
LICHTHEIM, Miriam.
Ancient Egyptian Literature. Los Angeles: University of California Press, v. 2,
2006.
SCHWEIZER, Andreas. The
Sungod’s journey through the netherworld: reading the Egyptian Amduat. Ithaca: Cornell
University Press, 2010.
SCOVILLE,
Priscila. Queremos nos amar como irmãos: uma análise historiográfica das cartas
de Amarna e das relações entre Egito e Mitani entre c. 1390 – 1336 AEC.
Dissertação de Mestrado. Curitiba: UFPR, 2017.
Preliminarmente grato por compartilhar conosco este foco de estudos. Fiquei com uma inquietação: Como o educador poderá trazer para sua práxis pedagógica esta omissão em retratar o Oriente Próximo???
ResponderExcluirIsac Silva de Almeida
Olá Isac, obrigada pela pergunta!
ExcluirExistem muitas formas de trabalhar essa questão do orientalismo, mas a abordagem depende da turma. Eu, particularmente, gosto de usar filmes (ou outros aparatos midiáticos). O filme 300, é um bom exemplo para propor a reflexão: os espartanos (ocidentais) são retratados como homens másculos, honrados, com físico invejável; já os persas (orientais) são dourados, cheios de piercings, maus por essência. Temos que relativizar essa representações e pensar o lado persa, mostrar como eles se viam, sua arte; Persépolis e todo o seu cosmopolitismo.
Priscila Scoville
Parabéns. ótimo texto. Gostaria de saber quais relações entre a religião do oriente antigo e o modo de vida atual desse povo podem ser abordadas no ensino fundamental II ???
ResponderExcluirMarcos
Olá Marcos, obrigada pela pergunta.
ExcluirBom, em primeiro lugar é preciso diferenciar o antigo do atual, já que hoje a habitação da espaço é completamente diferente e a visão de mundo muda. Talvez o Irã seja o lugar que melhor resgata e valoriza suas raízes persas - o que pode ser um começo.
Mas para trabalhar essas duas realidades (antigo e novo) é preciso falar de primavera árabe, califados, islamismo... Uma coisa legal pra propor é a leitura do HQ Persepolis.
Priscila Scoville
Muito interessante o texto, parabéns. Contudo, tenho duas perguntas:
ResponderExcluir1.No início do ensaio, é mencionado o caráter marcadamente ocidental do discurso historiográfico, o que leva a certas generalizações e simplificações no que se refere aos povos do oriente. É citado o exemplo dos “mesopotâmicos”- embora a denominação faça referência a uma região, usualmente ela é tomada como dizendo respeito a um grupo étnico. Minha pergunta é: como as culturas antigas do oriente próximo podem ser trabalhadas na educação básica de uma maneira que tais simplificações e generalizações sejam evitadas?
2.No final do texto, é mencionado, de passagem, certo paralelo entre as narrativas do oriente próximo e os mitos gregos. É possível identificar a influência das narrativas orientais sobre as narrativas gregas? Como isso contribui para uma desconstrução do famigerado mito do “milagre grego”?
João Marcos Cilli de Araujo
Olá João, muito obrigada pelas perguntas.
Excluir1. Acho que a abordagem depende de cada turma, mas eu, particularmente, gosto de frisar a interação, os contatos e influências. Mostrar a antiguidade como um pequeno mundo mesmo, estilo "o Mediterrâneo" de Braudel. Acredito que se pararmos e trabalhar os povos isoladamente, de forma sequencial, nosso entendimento sobre os moldes em que o Oriente Próximo se desenvolveu ficam mais claros.
2. Essa segunda questão já foge da minha área de conhecimento, mas o que eu posso dizer, segura de que não falo besteira, é que existiu uma apropriação de deuses egípcios pelos gregos e Ísis é uma das que mais se destaca nesse sentido. Sobre o "milagre grego" eu não tenho uma base teórica em Grécia para fazer muitas afirmações, mas a Grécia (não com esse nome) já estava em contato com o oriente desde, pelo menos, o segundo milênio AEC, e se muniu de muitas tecnologias e interpretações, como a astronomia, a medicina e o alfabeto. A diferença principal é que "filósofo" não era uma profissão no mundo oriental, essas reflexões ficavam entre oráculos, físicos, sacerdotes, etc. e eram formas de se explicar o mundo prático e a religiosidade.
Priscila Scoville
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPriscila Scoville, gostaria, primeiramente, de parabenizá-la pela escrita de um texto tão fantástico e que nos faz literalmente mergulhar no mar de diversas culturas. Sou aluno graduando em História, e estou no oitavo período. Estou desenvolvendo minha pesquisa de TCC sobre bruxaria e feitiçaria em Minas Gerais do séc. XVII, fazendo um paralelo com as questões ligadas à religião, religiosidade e culturas naquele contexto. Não pude deixar de me maravilhar com a passagem do seu ensaio que se remete à questão das práticas medicinais por meio de rítios, músicas, hinos e atos simbólicos. Uma questão que me chamou muito a atenção é que, esse tipo de prática voltada à cura, em religiões como o Cristianismo, por muitos séculos foi repreendida é associada à prática de bruxaria. Assim, tenho uma pergunta:
ResponderExcluir1- As ligações entre as três noções de religião apontadas no texto, nos remetem à um contexto cultural comum (relacionando as passagens voltadas à figura da serpente e ao mar, por exemplo), o qual nos abre um imenso e rico leque de interpretações a repeito dessas religiões. Nesse sentido, gostaria de saber: em qual momento essas três culturas se comunicam no âmbito comum de práticas e culturas remetentes à povos diferentes, porém, com apropriações culturais diversas?
Obrigado.
Marco Antônio de Souza Figueiredo
Olá, Marco, tudo bom? Muito interessante tua pesquisa!
ExcluirTua pergunta é complicada de ser respondida de forma direta, pois não existe uma busca e influência ativa, pelo contrário, é paulatino, adaptável... Um debate legal para pensar nisso é sobre o conceito de fronteira. Isso porque os limites territoriais estavam em constante mudança e com areas hegemonias variadas. O ambiente não era habitado por apenas um grupo ou cultura, mas por muitos ao mesmo tempo. Assim, mais do que um centro de culturas, a fronteira também servia para propaga-las e criar novas, que atendessem a realidade de todos aqueles que viviam ali. Veja, por exemplo, digamos que eu sou um hebreu, vivendo em Canaã, onde outros grupos egípcio e semitas também habitam. Eu não vou largar minha crença por causa desse contato, mas as coisas que eu não concordo na religião hebraica, ou que não satisfazem o meu entender de mundo, podem ser encontradas nas falas daqueles que vivem ao meu redor - consequentemente, sou influenciada. Isso não significa que eu adotei um culto diferente, mas aceitei uma explicação que se encaixa no meu.
É assim que acontece o sincretismo na maior parte dos causos, de forma involuntária e passiva. Além disso, as religiões antigas, em especial, tinham muitas explicações pela vivência e pelo que a natureza proporcionava (dai temos cultos ao sol, a água, etc: são essenciais para a vida, portanto, devem ser divindades). Com uma realidade física muito parecida, o desenvolvimento das crenças vai ser aproximado, justamente para explicar aquele ambiente.
Por isso, não tenho como te dizer qual foi o momento de comunicação, aconteceu aos poucos, durante séculos.
Priscila Scoville
Boa tarde,
ResponderExcluirPrimeiramente Priscila Scoville parabéns pelo artigo. Verificando as semelhanças entre as passagens de diferentes religiões deste oriente especifico, seria possivel elencar historiograficamente que elas poderiam ter evoluido de uma memoria historica de povos e civilizações mais antigos e se espalhado e se adequado às novas regioes que alcançavam?
André Vinícius Gomes de Carvalho
Olá, André. Tudo bom?
ExcluirÉ difícil "bater o pé" sobre a origem de uma crença, mas de forma geral, o constante contato com grupos diversos, em um ambiente familiar é bastante propício para intercâmbios. Dá uma olhadinha no que eu falei para o Marco Antônio, que explico um pouco mais disso.
Priscila Scoville
Boa noite, parabéns pelo ótimo texto. Esse intercâmbio de influências religiosas entre os povos do Oriente Próximo mencionado, que influência também o que vem a ser o catolicismo, se dava de que maneira?
ResponderExcluir- Luana Cantalice Dias.
Olá, Luana!
ExcluirO impacto mais direto vai depender de qual vertente do catolicismo estamos falando, mas toda Igreja Católica (incluso a Roma, que é a mais conhecida) é fortemente influenciada pela escrituras hebraicas do Antigo Testamento, que refletem esse mundo próximo-oriental.
Priscila Scoville
Prezada Priscila Scoville, desde já gostaria de parabenizá-la pela excelente Conferência apresentada... acho interessante compartilhar algumas impressões positivas a este respeito...
ResponderExcluirDe fato, ainda testemunhamos uma percepção, digamos, “hemisférica” de História Antiga em nossas Graduações, ainda muito atávicas às redomas judaico-cristã e greco-romana... com certeza essa dupla compreensão das culturas antigas, seja em si mesmas, seja em relação com outras culturas (principalmente no que toca aos intercâmbios econômicos e culturais), é uma possibilidade riquíssima que não aproveitamos devido a esta lacuna em nossos programas universitários de História, inclusive profícuas para a própria reflexão teórica e metodológica da História como disciplina acadêmica para abordar o "homo historicus" que transcenda geografias e temporalidades, metodologias investigativas e produções de memória do(s) Ocidente(s);
Como não lembrar das contribuições de Giambattista Vico (1668-1744) ao apontar, em sua “Ciência Nova”, exatamente para estes rituais fúnebres como um dos princípios da mesma obra: “Observamos todas as nações bárbaras e humanas, ainda que, por imensos intervalos de espaços e tempos, entre si distanciadas, guardarem esses três humanos costumes: todas possuem alguma religião, todas contraem matrimônios solenes, todas sepultam seus mortos; mesmo dentre as nações mais rudes e selvagens, as mais requintadas cerimônias e mais consagradas solenidades residem nas religiões, matrimônios e sepulturas.” (VICO, Giambattista. “A Ciência Nova”. Rio de Janeiro: Record, 1999, p. 134). Menciono aqui Vico exatamente pela abertura metodológica que sua filosofia da história nos permitiria para vislumbrarmos um horizonte de diálogos “trans-hemisféricos” para além dos paradigmas de Atenas e Jerusalém...
ResponderExcluirPor fim, a rica e maravilhosa questão da serpente nas culturas antigas do mundo de um modo geral, europeias ou asiáticas. Cheguei a realizar uma abordagem mínima que eu gostaria de compartilhar aqui mediante seu texto. Em Artigo publicado na Revista Mundo Antigo, Ano II - Volume II - Número 1, pp. 151-165, parti exatamente do Livro de Isaías enquanto um caso de exceção teológica judaica a algumas afirmações na obra “Mitos e símbolos na arte e civilização da Índia”, do estudioso das religiões e filosofias da Índia, Heinrich Zimmer, apontando exatamente para esta oposição estrita entre a divindade criadora do cosmo e o monstro instaurador do caos (mais especificamente Is 11,6-9), a qual, neste caso, não encontra respaldo no trecho supracitado de Is...
ResponderExcluirOlá Matheus! Muito obrigada pela contribuição bastante pertinente. Infelizmente, o espaço que temos para trabalhar tudo fica pequeno nos eventos e muita coisa fica de fora. Por isso, teus comentários foram super bem vindos!
ExcluirNão conhecia esse artigo da Mundo Antigo, mas com certeza irei atrás disso também!
Obrigada
Priscila Scoville
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ExcluirPrezada Priscila Scoville, nós é que agradecemos pela contribuição ímpar de sua Conferência...!!!! Mais uma vez, parabéns pela produção... parabéns para todos nós pelo 3º Simpósio Eletrônico de História Oriental...!!!!
ExcluirOlá, primeiramente gostaria de parabenizar pelo texto e reflexões abordadas, fantástico.
ResponderExcluirSobre o final de seu texto você aborda sobre as serpentes serem a personalização do mau e isto em partes devido a relação entre o medo no imaginário das pessoas e a enfestação, principalmente levando em conta que para os egípcios, sabemos que buscavam na natureza, no que possuíam um contato direto, a representação dos fenômenos. A partir disso, gostaria de saber pq outros animais que também poderiam representar um risco, seja aos indivíduos quanto às colheitas, como crocodilo e escaravelho respectivamente, assumem uma imagem que flerta com o divino?
Guilherme Silva
Olá Guilherme, tudo bom? Muito obrigada pela tua pergunta.
ExcluirÉ uma questão um pouco complicada, o mundo antigo (em especial no Egito) é muito dual. Para existir o bem, o mal também precisa existir. Assim, aos nossos olhos a serpente parece algo completamente negativo, mas na visão antiga não era. Se essa serpente não existisse, o mundo inteiro não existiria. O corpo de Tiamat foi usado pra criar o mundo, e Rá só renasce depois que derrota Apep.
No Egito, inclusive, existem serpentes boas, que ajudam o faraó e o próprio Rá na derrota de Apep.
Os animais perigosos, ou não, fazem parte da vida cotidiana e são necessários para a manutenção do equilíbrio cósmico (a maat), e, por isso, estão presentes nas crenças.
A polarização de bem vs mal é muito maior no Antigo Testamento, mas lembremos: até mesmo Lúcifer é um anjo do reino dos céus.
Priscila Scoville
Olá, adorei o texto. Tenho uma questão sobre o sincretismo religioso envolvendo o cristianismo.
ResponderExcluirA cultura cristã que será desenvolvida ao longo de toda idade média, pode-se relacionar ela como bebendo diretamente nessas fontes, não só a questão de mitos religiosos (conforme citou o Leviatã) mas também nas próprias práticas de ritos e pensamentos, como a mentalidade da morte por exemplo?
Gustavo Robaski Borba
Olá Gustavo,
ExcluirNa medida em que o cristianismo nasce no catolicismo (muito influenciado pelas escrituras hebraicas do Antigo Testamento), faz todo o sentido que existam influências. Não necessariamente de uma forma direta, porém.
Priscila Scoville
Sebastião Vicente da Silva 08 de agosto de 2019
ResponderExcluirtiaoellbello@hotmail.com
Muito fantástico, o texto já inicia dando uma poderosa dica e de certa forma uma crítica ao conceito eurocêntrico de história e a preferência dos ocidentais pelas civilizações que melhor os convém. Primeiramente minha pergunta é de que maneira posso introduzir nas minhas aulas de história outras civilizações ou melhor as civilizações orientais sem fugir muito do que determina a BNCC OU CURRÍCULAS DAS ESCOLAS?
SEGUNDO QUE ACHEI MUITO BOM SÃO OS COMPARATIVOS RELIGIOSOS perfazendo um caminho dos ditos estados teocráticos orientais politeístas com a civilização judaico cristã monoteísta, de certa forma se percebe uma semelhança nas crenças.Será que pode se concluir que o resultado das religiões atuais seja de um sincretismo religioso, distinguindo uma religião das outras somente alguns dogmas?
Olá Sebastião, tudo bom?
ExcluirPra tua primeira pergunta, dá uma olhadinha nas respostas que dei ao Isac, ao João e ao Marcos (lá nos primeiros comentários); mas de forma geral, eu gosto de pensar a interação e propor a reflexão comparativa dos alunos.
Para a segunda questão, isso é uma visão muito pessoal, eu não conheço todas as religiões, mas acredito que elas se desenvolvam respondendo ao seu contexto e se adaptem em relação a outras. Ser estático demais, significaria deixar de fazer sentido no mundo atual e ter cada vez menos adeptos.
Priscila Scoville